Quais os critérios para classificar um serviço como construção civil?
Os critérios para classificar um serviço como construção civil são muitos e exploramos a fundo esse ponto, dadas as controvérsias verificadas no campo prático.
Encontramos na doutrina e jurisprudência critérios que são adotados para a classificação de um serviço como construção civil.
Aires Barreto, considera que para ser caracterizada como obra civil, a instalação ou montagem deve ser precedida de projetos de engenharia (ISS na Constituição e na Lei. 2.ed. São Paulo: Dialética, 2005).
Diz o consagrado tributarista municipal:
“O item 7.02 da lista de serviços trata, portanto, de obras de engenharia. Por isso, normas editadas pelos Estados (como São Paulo e Minas Gerais) reconhecem como obras de construção civil a execução de obras de montagem e construção de estruturas em geral. A lembrar que ‘estrutura’ neste caso significa armação, arcabouço, conjunto de uma obra de engenharia.
Da mesma forma, o Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia descreve como atividades inerentes aos seus profissionais, dentre outras, a condução de equipe de instalação, montagem, operação, reparo ou manutenção; a operação e manutenção de equipamento e instalação.
Vem daí a inclusão no item 7.02 dos serviços de instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos. Serviços de obras de construção prestados por empreitada ou subempreitada.
Como foi visto, costuma-se dizer que esses serviços oferecem como resultado um produto, peça ou equipamento que se integre permanentemente ao solo.
Tal afirmativa é perigosa se for interpretada em sentido literal, e não deve ser usada como condição única, pois, em muitos casos, o bem instalado ou montado não vai aderir ao solo de forma tão evidente. A instalação de cabos e fiação aérea é um exemplo. A montagem e instalação de esteiras rolantes ou elevadores são outros exemplos. E ainda temos a instalação de teleféricos e outros equipamentos que não vão, de certo modo, se fixar ao solo. E nem por isso, montagem e instalação de cabos e fiação aérea, de esteiras rolantes, de elevadores, de teleféricos, etc., deixam de serem serviços de engenharia, e enquadrados no item 7.02.
Já em relação ao item 14.06, estamos tratando de trabalhos mais “simples” de instalação e montagem de aparelhos, máquinas e equipamentos, quando prestados diretamente ao usuário final e utilizando, exclusivamente, materiais por ele fornecidos. Compra-se um ventilador de teto residencial e contrata-se alguém para fazer a sua montagem e instalação; compra-se um fogão doméstico e contrata-se alguém para fazer a instalação do gás e da parte elétrica; a indústria adquire uma prensa e contrata alguém para fazer a sua instalação; e assim por diante. Tanto o ventilador de teto, o fogão e a prensa são pertenças que podem ser removidas sem causar grandes problemas ao prédio onde estão instalados. Em resumo, não são serviços de engenharia.” (Enquadramento do ISS nos serviços de instalação e montagem, site www.consultormunicipal.com.br).
Portanto, pelos textos doutrinários transcritos acima, vê-se que a boa doutrina vem elegendo os seguintes critérios (isolados ou conjuntos) para o enquadramento dos serviços ora discutidos no item 7.02 da lista de serviços:
1) aderência dos equipamentos ao imóvel;
2) existência de projeto de engenharia precedendo os serviços que serão executados;
3) essência (natureza) do serviço.
Tais exegeses vêm contando com o abono da nossa jurisprudência, se não, vejamos:
“STJ – RESP nº 947.935 e nº 188.760 e no AgRg no RESP nº 804.724. TRIBUTÁRIO. ISS. USINA HIDRELÉTRICA. INSTALAÇÃO DE TURBINA. CONSTRUÇÃO CIVIL. INCIDÊNCIA.
1. Hipótese em que se discute a incidência do ISS sobre a montagem de turbinas em usina hidrelétrica que estava sendo construída no território do recorrido. (…)
4. O cerne da lide está na qualificação jurídica dos serviços de montagem de turbinas e seu enquadramento no conceito de construção civil para fins de incidência do ISS. A empresa argumenta que não exerce essa atividade (construção civil).
5. Não há falar em usina hidrelétrica sem turbinas. Assim, é notório que a instalação desses equipamentos integra necessariamente a construção da usina.
6. O STJ tem jurisprudência no sentido de que a instalação de equipamentos de ar condicionado central é equiparada a serviço de construção civil, para a cobrança do ISS.
7. Se a instalação de ar-condicionado central, que é equipamento não essencial, configura serviço de construção civil, com muito mais razão a montagem de turbinas em usina hidrelétrica.”
“STJ – RECURSO ESPECIAL Nº 188.760 – MG. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. ICMS. INSTALAÇÃO E MONTAGEM DE AR CONDICIONADO. SÚMULA N. 7/STJ. DECRETO-LEI N. 406/68. LISTA DE SERVIÇOS. ITEM 32.
1. Aplica-se a Súmula n. 7/STJ na hipótese em que a tese versada no recurso especial reclama a análise dos elementos probatórios produzidos ao longo da demanda.
2. A instalação e montagem de sistema de ar condicionado que compõe os serviços de engenharia sujeita-se ao ISS, sendo indevida a incidência do ICMS (item 32 da lista de serviços anexa ao Decreto-Lei n. 406/68).
3. Recurso especial não conhecido.”
O Ministro João Otávio Noronha, para defender o mesmo tratamento dado pelo Tribunal a quo à instalação e montagem de ar condicionado central, ou seja, a tributação pelo ISS conforme item 32 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 56/87, citou parte de decisão daquele Tribunal:
“É o caso dos autos, em que as mercadorias não são de fabricação da impetrante, adquiridas de terceiros, gravadas com ICMS, destinadas precisamente à instalação e montagem do ar condicionado central, serviço de engenharia que provoca a agregação do complexo de resfriamento na obra, de tal sorte que a ela adere.
Assim, tratando-se a instalação do sistema de obra que compõe os serviços de engenharia, a solução encontrada foi a mais correta, não sendo válida a comparação que se quis fazer em relação ao item 74 da mesma lista, para descaracterizar a hipótese de incidência.”
“TJMG – Tributário. Instalação de centrais telefônicas. Submissão apenas ao imposto sobre serviços. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.00.122802-2/000 – COMARCA DE BELO HORIZONTE – APELANTE(S): 1º) JD DA 2ª VARA FAZENDA COMARCA BELO HORIZONTE, 2ª) FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS – APELADO(S): CONSTRUTEL PROJETOS E CONSTRUÇÕES LTDA. – RELATOR: EXMO. SR. DES. PINHEIRO LAGO.
O Relator Pinheiro Lago, em seu voto, caracteriza a instalação de centrais telefônicas como obras de construção civil sujeitas apenas ao ISS, muito bem argumentando:
“Na situação analisada, após leitura atenta dos autos, não se pode negar que os serviços prestados pela autora, de instalação de centrais telefônicas, constituem modalidade de construção civil, submetidas, pois, ao campo de incidência do imposto sobre os serviços, por prescindirem de um projeto de engenharia específico, objetivando seu dimensionamento em função do tráfego previsto e limites toleráveis de congestionamento, previsão de demanda de assinantes, cálculos de transmissão, interligação com as redes adjacentes ou de longa distância e uma série de projetos complementares (plantas de localização, de ferragens, suprimento e distribuição de corrente contínua e de sinalização, cálculo de acumuladores, conforme anota Moisés Akselrad (apud José Eduardo Soares de Melo. Op. cit. pp. 83-84).”
“DECISÃO: 9096102-05.1998.8.26.0000
ÓRGÃO JULGADOR: 10ª Câmara (Extinto 1º TAC)
DATA DO JULGAMENTO: 30/11/1999
IMPOSTO – ISS- Instalação e montagem de estações telefônicas e afins – Incidência – Local da prestação do serviço – Recursos oficial e voluntários providos.”
Cuidou esta decisão de considerar como serviços de engenharia civil, a instalação e montagem de equipamentos de telecomunicações, estações centrais telefônicas e outros sistemas de telecomunicações e telefonia e equipamentos afins. Isso se baseou em laudo pericial em que engenheiro, com fulcro em Resoluções do Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura, concluiu que esses serviços competem a engenheiro eletrônico, ou eletricista ou de comunicação.
Portanto, os critérios para se inserir o serviço de instalação e montagem como execução de obras de construção civil, hidráulicas e de outras obras semelhantes foram:
a) a natureza do serviço, que é de engenharia,
b) o sentido amplo de construção civil, que não compreende só as edificações propriamente ditas, mas as várias atividades relacionadas a outras espécies de engenharia.”
“STF – RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 857.433 RIO GRANDE DO NORTE. TRIBUTÁRIO. ISSQN. INCIDÊNCIA. CONTROVÉRSIA QUANTO À NATUREZA DA OPERAÇÃO TRIBUTADA. EMPREITADA TOTAL OU LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS ACOMPANHADA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DECISÃO: Trata-se de agravo nos próprios autos interposto por HOT LINE CONSTRUÇÕES ELÉTRICAS LTDA, com fundamento no artigo 544 do Código de Processo Civil, objetivando a reforma da decisão que inadmitiu seu recurso extraordinário manejado com arrimo na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão assim ementado:
“TRIBUTÁRIO. ISS. INSTALAÇÃO DE LINHAS DE TRASMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. ROL ANEXO DA LEI COMPLEMENTAR 116/2003. CONTRATO CELEBRADO ENTRE AS PARTES CUJO OBJETO É EMPREITADA. INEXISTÊNCIA DE ATIVIDADE DE LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA VINCULANTE 31. MATERIAL EMPREGADO. DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO ISS. POSSIBILIDADE. RE 603.497/MG, RECURSO CONHECIDO E PROVIDO APENAS PARA QUE SE PROMOVA A DEDUÇÃO DOS CUSTOS DOS MATERIAIS EMPREGADOS NA INSTALAÇÃO DAS LINHAS DE TRANSMISSÃO. PRECEDENTES. Segundo disposição contida no anexo de serviços da Lei Complementar 116, de 31 de julho de 2003, incide ISS sobre a execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICMS). Desse modo, a atividade de instalação de linhas de transmissão submete-se à incidência do ISS, já que não pode ser considerada atividade de locação de bens móveis, a atrair o disposto na Súmula Vinculante 31. Com efeito, a atividade desenvolvida pela Apelante se amolda ao trecho concernente ao de ‘empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes’ constante no anexo da LC 116/2003 e decorrente do objeto do contrato celebrado entre as partes: empreitada total.”
De outro lado, a atividade de construção civil também guarda proximidade com a industrialização, e consequente conflito aparente com o IPI.
Com efeito, por maioria de votos, a 1ª Turma do STJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, deu provimento ao RESP nº 1.231.669, j. em 07/11/2013, DJe de 16/05/2014, em favor de uma empresa atuante na atividade de fornecimento de elevadores, no sentido de afastar a cobrança do IPI. Eis a ementa do acórdão:
“TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ELEVADORES. IPI. NÃO INCIDÊNCIA.
1. A atividade de fornecimento de elevadores, que envolve a produção sob encomenda e a instalação no edifício, encerra, precipuamente, uma obra de engenharia que complementa o serviço de construção civil, não se enquadrando no conceito de montagem industrial, para fins de incidência do IPI.
2. Recurso especial provido.”
A empresa, autora da ação, assim explicou essa atividade de fornecimento de elevadores, enquadrando-a como uma obra de engenharia:
“No desempenho de suas atividades sociais a autora é contratada para produzir elevadores destinados a integrar obras de construção civil.
A produção dos elevadores é contratada, caso a caso, pelos proprietários dos imóveis em construção.
Inicia-se com o fornecimento das plantas relacionadas à construção civil, de modo a conhecer-se as características básicas do edifício e a identificar-se o tipo adequado de elevador que tenha as características compatíveis à edificação e às necessidades de uso.
A partir desses dados é elaborado, em conformidade com a norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT – NB – 596⁄182, da Comissão de Estudos de Elevadores do Comitê Brasileiro de Construção Civil, o Cálculo do Tráfego nos Elevadores, com vistas a serem identificadas as condições mínimas exigíveis a assegurar condições satisfatórias de uso.
Mediante esse estudo técnico são calculados o volume de tráfego em função da população estimada do edifício, o intervalo de tráfego e a lotação das cabinas, de acordo com a destinação do edifício (p.e., escolas, hospitais, hotéis, apartamentos, escritórios comerciais, etc), considerando-se, ainda, vários outros fatores técnicos, tais como o tempo de abertura e fechamento das portas, o tempo de viagem, de percurso total, de aceleração e retardamento e de entrada e salda de passageiros.
Concomitantemente, são realizados os estudos técnicos relacionados à norma ABNT – NBR NM 207, visando estabelecer os requisitos exigidos à segurança para a construção e instalação dos elevadores, de forma a assegurar a integridade física dos usuários, pessoal de manutenção e inspeção e das pessoas que se encontram fora das instalações dos elevadores mas que possam ser atingidas na eventualidade de ocorrência de falhas mecânicas, elétricas ou estruturais. Em suma, procede-se a estudos técnicos gerais aplicáveis à construção elétrica, mecânica ou de edificação, incluindo a proteção dos elementos do edifício contra fogo, para serem definidas as regras de segurança relativas a elevadores com vistas a proteger as pessoas e objetos contra acidentes relacionados com as operações pelo usuário, de manutenção e de emergência dos elevadores.
Com base nesses dados preliminares, elabora-se o orçamento do custo de fornecimento e instalação. Aprovado o orçamento e firmado, é realizado um Projeto Executivo, que compreende a elaboração:
a) de Planta Baixa do edifício a orientar o proprietário da obra na construção da caixa de corrida e poço (espaço físico, limitado pelo fundo do poço, as paredes e o teto, onde a cabina e o contrapeso se deslocam), na qual também são instaladas as guias (componentes rígidos destinados a manter a direção do movimento da cabina ou do contrapeso), o contrapeso (massa que assegura a tração), o ponto fixo destinado a receber o cabo de comando (cabo elétrico flexível entre a cabina e um ponto fixo), a par de outros detalhamentos técnicos, bem como as orientações para a construção do poço, no qual também é instalado o pára-choque (meio físico destinado ao retardamento usando fluidos ou molas);
b) de Planta relativa à Casa de Máquinas (recinto no qual serão instaladas as máquinas e os equipamentos a elas relacionados);
o) de Planta do Detalhamento para Construção das Frentes, isto é, as instalações físicas adjuntas ao edifício necessárias à colocação das portas de acesso, soleiras e guias;
d) de detalhamentos concernentes às Características Elétricas necessárias à instalação do elevador (funcionamento e dispositivos de segurança).
Após aprovado o projeto pelo proprietário da obra, inicia-se a elaboração dos componentes físicos, conforme especificações técnicas antes definidas, e o planejamento prévio de instalação, isto é, a adequação da obra civil para receber a instalação do elevador e seus componentes mecânicos e elétricos.
Acrescente-se que a autora responsabiliza-se pela qualidade dos materiais empregados e dos serviços de montagem e instalação dos elevadores, garantia essa contratual e acrescida da legal estabelecida pelo artigo 50 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990)”.
Por sua vez, o ministro relator assim fundamentou seu voto contrário à incidência do IPI, uma vez que a atividade implicaria em uma obra de engenharia (prestação de serviço sujeito ao ISS) e não a uma atividade industrial:
“Digo isso porque na atividade de fornecimento de elevadores para integrar obra de construção civil, em pese sejam empregados diversos materiais que compõem esse veículo, sobressai o cumprimento de uma obrigação de fazer, relativa à prestação de um serviço técnico especializado de engenharia, a ser realizada de forma individualizada, a fim de viabilizar o transporte vertical segundo as necessidades e especificações de cada edificação.
Sob esse enfoque, verifica-se que da instalação do elevador não se obtém, propriamente, um “novo produto ou uma unidade autônoma” (art. 4º, III, do Decreto 4.544⁄02), mas, sim, uma funcionalidade intrínseca à própria construção do edifício, a ela agregando-se de maneira indissociável, uma vez que, fora do contexto daquela específica obra, o elevador, por si só, não guarda a sua utilidade.
Nessa toada, resta evidenciado que o contrato para a montagem de elevador é de empreitada de um serviço complementar de construção civil, enquadrando, assim, na prestação de serviço elencada nos itens 32 do DL 406⁄68 e 7.02 da LC 116⁄03, passível, portanto, de incidência do imposto do ISS”.
Portanto, o ministro se inclinou para o entendimento de que a atividade era um serviço (obra de engenharia), por prevalecer o cumprimento de uma obrigação de fazer, um serviço especializado de engenharia, desenvolvido de forma individualizada (personalizada), pois visa atender as necessidade e especificações de cada edificação. E mais, o tribunal também analisou a questão sob uma interpretação finalística, pois entendeu que o elevador está necessariamente inserido dentro de uma construção, até porque o elevador só tem utilidade (finalidade) dentro de um edifício.
Enfim, essa contextualização ou correlação entre a atividade desempenhada e a inserção de materiais ou bens em uma obra, é mais um critério apto para atrair a incidência do ISS, como uma modalidade de obra de engenharia.